O casal de anfitriões, Alberto
e Beatriz, celebra a riqueza presenteando seus convidados com o tradicional banquete
aos domingos em um oásis entre concreto e asfalto e grandes janelas de vidro
que cercam seu paraíso urbano, uma vitrine das conquistas dos escolhidos. Não
se compadecem ou se incomodam com os olhares curiosos e famintos que espiam
entre as grades do grande portão de ferro fundido, olhares cotidianamente
acusados por Diógenes, que faz questão de apontá-los ao dono da casa. A contragosto
do patrão, os olhares comem os restos e as migalhas permitidos a eles apenas
por estarem do lado de fora – mas sob controle de Alberto que detém cada vez
mais os recursos ao redor e diz que tudo dentro de seus portões pertence a ele.
Beatriz exalta sua opulência em forma de comida à mesa, descrição dos sabores e
efusividade em falar de cada prato servido e seu paladar, e deixa claro o
aumento de seu poder quando novos empregados surgem no decorrer das cenas,
pessoas da rua engolidas pelo portão em que eles mesmos se apoiam buscando alento,
um portão que é ele mesmo uma personagem viva que se move para dentro e para
fora devorando corpos, objetos e terreno. Nenhuma riqueza das personagens tem
sua origem revelada, a exceção da de Natasha, esposa de Diógenes, que confessa ter
seu pai como provedor da herança, transferida pelo patriarcado a seu esposo. O
dinheiro de Charles, o pastor esposo de Rita, é ampliado pela dedicada
exploração da fé acusada por Diógenes, amigo de longa data que com ele resgata a
memória violenta de uma festa de Natal que situa o pastor na persecução da
realidade a que se habituou, recusando-se a ser ele próprio um “menino de rua”.
Como boa esposa defensora da imagem e dos símbolos, Rita articula o assassinato
de Diógenes pelas mãos de sua esposa, movida pelo ciúme de uma vida que, tendo
existido, teria a excluído da realidade: a união de Charles e Natasha que nunca
acontecera. Ao lado de Beatriz, influencia a todo custo o envenenamento pelo
sempre presente “copo meio cheio”. Diógenes aceita seu destino e se dedica aos
goles, um após o outro, dos copos cheios que o ambiente lhe proporciona, tragando
o prazer e o sabor do Tempo que se aproxima a cada gole.
Ele, O Tempo, a deusa-menina,
rompe a barreira do real na visão de Diógenes e – sob a tutela da Narradora –
se apresenta a ele impondo sua condição: O Tempo é o grande deus e tudo nele
existe, tudo escorre por entre seus dedos que criam e encerram a vida como uma
criança brincando com argila e gargalhando seus feitos vendo tudo ao redor se
dissipar.
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