Existe um ponto – ou vários
pontos – de alinhamento destes comportamentos: o egoísmo emparelhado à
social-coletividade. Mas, primeiro, o que chamo de social-coletividade, já
que social (de sociedade) e coletivo (de coletividade) aparentemente parecem
sinônimos?
Pois bem,
não vejo desse modo – considerando que “humanidade” não é o coletivo de Homens
ou seres humanos. Social, acredito eu neste texto, é um comportamento quase que
inconsciente de coexistência de pessoas em um mesmo meio ambiente. Porém,
pode um indivíduo não ser totalmente sociável, mesmo inserido neste ambiente
em questão (por exemplo, num ambiente de trabalho, equipes etc.). Sentir-se membro de uma
sociedade, ou seja, sentir-se parte dela, está ligado a um sentimento de
pertencimento, de uma proximidade tão real que nos torna atraídos e inseridos
por ela. Paralelamente a isso, coletividade é parte do comportamento deste
nosso sentimento de sociabilidade.
Podemos fazer parte e nos sentir parte de
uma sociedade, mas, não necessariamente atraídos pelas mesmas questões de
coletividade. Coletivo (de pessoas) está ligado a uma identidade ainda mais
íntima às causas comuns. Convivo em sociedade, pois nasci, cresci e me criei
nesta sociedade, absorvi seus costumes, seus comportamentos, suas regras e
criei sobre elas as minhas próprias. Porém, numa coletividade, as questões são mais
restritas, pois devem ser tão mais atraentes para o indivíduo que tantas outras
questões comuns, fazendo dele alguém realmente preocupado e pertencente à
realidade coletiva em questão. Coletivo, neste texto, então, é uma parte ainda
menor de uma sociedade na qual estamos inseridos: é a fatia do bolo com a qual
nos identificamos ainda mais, é o pedaço que queremos para a gente. A sociedade
como um todo existe e estamos todos nela. A coletividade, no entanto, é quase
um sinônimo de pertencimento e autoafirmação de mim dentro de um grupo
específico.
Na contramão está o egoísmo da genética,
o egoísmo do eu e a vontade do
indivíduo de não estar, não fazer parte e não representar e se sentir
representado pela coletividade. É o indivíduo movido por seus próprios
impulsos. É aquele que, antes de tudo, levará em consideração a si mesmo e seu
bem-estar antes de mais nada, e tudo a sua volta se tornará apenas um mar de
possibilidades para alimentar seu próprio ego. Contudo, não desconsidere esse parágrafo e não pense que este comportamento está equivocado ou que em
tempos de globalização cultural de nós mesmos esse sentimento esteja
absolutamente errado. Não. Não está. Pois, a genética nos obriga a pensar em
nós mesmos. O corpo nos obriga. O tempo nos obriga. É o egoísmo da
sobrevivência do eu se digladiando com
todas as nossas emoções e sensações quanto ao outro. Afinal, se eu não
sobrevivo às lutas do dia a dia, quem será e quem se importará com o outro? Para que o outro, a outra pessoa,
o outro ser humano a minha volta exista, é necessário que eu também exista, do
contrário será apenas um. Sem mim,
sem o egoísmo da minha própria existência, o outro deixa de existir
instantaneamente. A genética, a organicidade de meu corpo e minhas experiências
e contraexperiências é o que torna possível a existência de todos à minha
volta. Saber que “de amanhã” eu não passo é o que cria em mim a ânsia por
existir em um meio no qual eu seja reconhecido, reconhecendo este meio e
fazendo parte dele (num amplo sentido de social-coletividade). Sem o eu, nada existe. Pois sem mim não existe consciência sobre o todo. Então, parece que o egoísmo de
minha própria existência não está totalmente na contramão da coletividade, não
é? Pois para que a coletividade exista, antes de tudo é necessário que exista
minha própria consciência sobre o eu
mesmo. Do contrário não seria possível à coexistência deliberada e funcional, a
coexistência orgânica do beneficiamento e aproveitamento de ambas as partes (o eu e o outro/coletivo). Sem minha
consciência sobre o que sou, o que quero, o que posso e o que tenho a oferecer,
minha existência na sociedade – e numa coletividade – torna-se apenas uma
habitação extremamente rápida e passageira de uma vida de simples osmose, do
tipo “estou aqui e não tenho nada a oferecer à ninguém, pois não compreendo e
não assimilo que outros tenham também algo a me oferecer”. O vazio absoluto. O nada.
A existência vazia de um mosaico sem cor como uma folha em branco onde nada
será escrito – e mesmo que seja, estará tão fragmentada que nada fará sentido.
Mas não quero entrar em questões absolutas do existencialismo do aqui e agora e
nem da metafísica do real. Deixemos isso para outro texto.
O egoísmo da genética, de minha própria
existência versus a
social-coletividade. O eu versus o todo versus uma pequena parcela deste todo. Mas, este versus não é o contra, é apenas o reconhecimento de que somos todos
diferentes e movidos por diferentes representações de nós mesmos e nossas
próprias vontades e impulsos. Lembrando Kierkegaard, mas não citando-o, só há
uma forma de estarmos totalmente fora de tudo isso. Do contrário, estamos todos
no mesmo barco e alguém precisa começar a remar para algum lado, mesmo que
existam divergências.
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